“O wonder!
How many goodly creatures are there here!
How beautious mankind is!
O brave new world,
That has such people in’t!” (Shakespeare, The Tempest, Ato V, Cena I)
“Admirável Mundo Novo” foi escrito na década de 30 pelo inglês Aldous Huxley. O título da obra vem da fala de Miranda do livro “A Tempestade”, de Shakespeare. Apesar de ter sido escrita há mais de 70 anos, o conteúdo de Admirável Mundo Novo permanece atual. A obra conta a história de uma sociedade totalmente organizada e planejada, na qual as pessoas são fabricadas em laboratório já com seus destinos predeterminados. Para que não haja reação à estabilidade, os indivíduos passam por reiterados condicionamentos ao longo da infância, como ouvir repetidas vezes as mesmas frases durante o sono para que lhes sejam incutidos pensamentos conformes ao sistema. As pessoas são treinadas para não manifestarem suas vontades e desejos. Para manter a felicidade, há o soma, uma droga química poderosa, distribuída em rações diárias para os trabalhadores.
Em um mundo repetitivo e monótono, onde o pensamento é cerceado, não faz sentido haver religião. Deus é Ford. Ao invés do sinal da cruz, faz-se o sinal do T. Os anos são contados a partir de Ford, tido como o pai da produção em série (no filme, até os humanos são produzidos em série – não há famílias, apenas superembriões capazes de gerar milhares de seres humanos idênticos). Para que a estabilidade seja mantida, essa insólita sociedade abomina mudanças. O pensamento científico e as artes são terminantemente proibidos. A higiene é cultuada. Não há doenças. Mas, em compensação, também não há sentimentos. Todos vivem felizes porque desconhecem uma outra forma de se viver.
Aqueles que, mesmo com todo o condicionamento, conseguem desenvolver o pensamento crítico e criativo são mandadas para ilhas para viver em comunidades. Ainda há “selvagens” no mundo, que ficam em aldeias bem demarcadas e são encarados como algo exótico. Selvagens são os que vivem como os seres humanos da época em que o livro foi escrito (em famílias, em casas, etc.).
Apesar da distopia, será que as novas descobertas científicas e invenções tecnológicas não estariam nos levando em direção a uma vida parecida com a narrada no livro? O homem fica maravilhado com as possibilidades abertas a cada novo invento e quer logo colocá-las em prática, mas muitas vezes se esquece de analisar os impactos possíveis dessa descoberta na vida das pessoas. Obviamente, não se tem como parar os avanços tecnológicos, mas é preciso ir com calma. Ao invés de se maravilhar com cada descoberta, as pessoas deveriam se preocupar em avaliar o impacto que ela poderá causar na sociedade antes de colocá-la em prática. Sem ordem e controle (paradoxal! é preciso ordem e controle para que se evite ainda mais ordem e controle!), sem pensar nas implicações éticas de um invento ou descoberta científica, poderemos acabar numa sociedade tal qual a narrada em Admirável Mundo Novo.
“– Mas eu não quero conforto. Quero Deus, quero a poesia, quero o perigo autêntico, quero a liberdade, quero a bondade. Quero o pecado.
– Em suma – disse Mustafá Mond –, o senhor reclama o direito de ser infeliz.
– Pois bem, seja – retrucou o Selvagem em tom de desafio. – Eu reclamo o direito de ser infeliz.” (Aldous Huxley, Admirável Mundo Novo, 2. ed., Editora Globo, 2006, p. 291)
É preciso reclamar o direito de ser infeliz, antes que seja tarde demais… Temos o direito de sentir, de sofrer, de sorrir, de chorar, enfim, de viver – nem que para isso tenhamos que abrir mão de certas comodidades do mundo em que vivemos.
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