Acho que estou precisando de um dia em que seja possível não fazer nada, absolutamente nada, o dia inteiro. Quer dizer, não necessariamente eu teria que ficar o dia todo lá parada, de bobeira, deitada sobre a cama e pensando na vida (até porque ‘deitar’ e ‘pensar’ são duas coisas a se fazer). Mas um dia em que eu não tivesse a obrigação de fazer absolutamente nada, que eu não precisasse lavar a louça, estudar matérias tediosas (ver distinção entre tedioso e entediante), ou responder e-mails (não que responder e-mails seja algo intrinsecamente chato – mas é algo que demanda tempo).
Um dia ideal seria aquele em que se acorda quando acaba o sono, ainda pela manhã. A seguir, toma-se uma farta xícara de café, acompanhada de pão quentinho, e frutas frescas. Logo após, senta-se à varanda para pensar na vida (para isso, seria necessário ter uma varanda, o que implica residir em uma casa longe do corre-corre e da insegurança dos grandes centros urbanos da atualidade), ver o mundo passar diante dos nossos olhos, e refletir sobre a existência. Daria para ler o jornal (mas só as notícias boas), ou então ler um bom livro (romance, obviamente – jamais um livro técnico). Por volta do meio dia, um almoço estaria nos esperando dentro de casa (não importa como que ele ficou pronto, não importa quem o fez: bastaria estar lá, pronto, sem que seja necessário improvisá-lo), com todos os pratos de que mais gostamos. A tarde seria utilizada para ter idéias. E idéias que pudessem ser concretizadas na forma de textos, contos, crônicas, trechos de diário, excertos que nunca serão lidos, ou até postagens de blogs – qualquer coisa é válida, desde que não seja cumprida por obrigação. O exercício da criatividade culminaria com a possibilidade de se divertir consigo mesmo, e perceber-se sorrindo, mesmo que se esteja sozinho. A noite poderia ser aproveitada com os amigos. Mas sem culpa, sem aquele sentimento de que se deveria estar estudando, ou que se está perdendo tempo possivelmente produtivo com atividades de lazer. A diversão poderia se estender até tarde, sem que se tivesse que se preocupar com a hora que se tem que acordar no dia seguinte. Em um dia ideal, não haveria dia seguinte, até porque um dia ideal, idealmente, nunca deveria terminar.
Mas, sejamos realistas – dias ideais não existem, conquanto são ideais. Há dias bons, bastante próximos do ideal, que eventualmente se sucedem em nossas vidas. Entretanto, quando acontecem, não somos capazes de percebê-los.
Parece que, com a correria do dia-a-dia, perdemos a capacidade de perceber o prazer das pequenas coisas. Vivemos tão presos ao próximo prazo, à necessidade de superar-se a si mesmo a cada dia, em busca de atingir as metas impostas pelas convenções sociais, que somos incapazes de apreciar um dia bom. Podemos até ter um dia livre. Mas não o aproveitamos integralmente – sempre haverá a preocupação com o próximo dia não livre, com a próxima atividade, com a matéria a ser estudada, com o relatório do trabalho.
Com tudo isso, reflito… em uma realidade em que viver um dia inteiro sem preocupações é praticamente um mito, será tão difícil assim querer apenas viver sossegada?
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