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Livro: O show do eu

21458457 O que nos leva a contar episódios de nossas vidas em um blog, a narrar tudo o que estamos fazendo no Twitter, a mandar para o YouTube vídeos das coisas que fazemos, a postar no Flickr fotos do que vimos, ou, pior, a reunir tudo isso em um único espaço como no FriendFeed? De onde vem essa necessidade constante de tornar pública nossa intimidade, de tornar nebulosa a fronteira da privacidade, enfim, de mostrar ao mundo como, o que, quando, onde e por que estamos vivendo?
O livro “O show do eu – A intimidade como espetáculo“, de Paula Sibilia (Nova Fronteira, 2008, 286pp.) procura desvendar os motivos da crescente espetacularização dos indivíduos, que revelam suas intimidades para conhecidos e anônimos, em especial na Internet, tanto na forma escrita como em vídeos e fotografias. Fruto da tese de doutorado da autora, o trabalho aborda o eu sob diversas perspectivas: o eu narrador, o eu privado, o eu visível, o eu atual, o eu autor, o eu real, o eu personagem e o eu espetacular.
Os exemplos são variados. De diários íntimos online – blogs intimistas, em que se conta de tudo – a diários de garotas de programa que se tornam livros. De webcams que transmitem incessantemente a rotina de pessoas comuns, a fotografias tornadas públicas de situações privadas.
Como explicar “fenômenos editoriais” como Bruna Surfistinha senão pela espetacularização do autor, pelo culto à personalidade? Pouco importa a obra produzida. Na sociedade atual, a inversão de valores é tanta que cultua-se o autor, ainda que nem obra possua:

“Qual é a principal obra que produzem os autores-narradores dos novos gêneros confessionais da internet? Tal obra é um personagem chamado eu, pois o que se cria e recria incessantemente nesses espaços interativos é a própria personalidade” (p. 233)

O livro parte do crescente papel de “eu, você, e todos nós” em narrativas disponibilizadas e popularizadas em especial via Internet. O ponto culminante desse fenômeno se deu por ocasião da escolha da personalidade do ano de 2006 pela Revista Time: Você. A capa da edição trazia um computador com uma tela parecida com a de um vídeo do YouTube. Entretanto, ao invés de trazer um vídeo qualquer estampado, havia ali um espelho. A personalidade do ano era você – mas também eu, e todos nós – que publicam conteúdo na rede, que narram para uma, duas, três ou 67 pessoas (olá, leitores anônimos do feed!) seus cotidianos (patéticos?) e suas vidas online.
Mais do que observação do outro e exposição de si próprio, tratam-se de pessoas reais que almejam ser (re)conhecidas. Toda essa publicização do eu pode levar a transformações da subjetividade contemporânea. E gera discussões quanto a questões como a privacidade na Internet.
A leitura do livro é recomendada para todos aqueles que disponibilizam informações pessoais na Internet e em outros espaços, ou que acompanham narrativas de outras pessoas, de ilustres desconhecidos a celebridades instantâneas, do vizinho do lado ao desconhecido que mora do outro lado do mundo.

Saiba mais:
Confira a entrevista concedida pela autora sobre o livro para o IHU On-Line.
Site oficial do livro – lá é possível ler o primeiro capítulo da obra.


[modo paranóia]
Engana-se quem pensa que isso tudo está longe de sua realidade. A fronteira entre público e privado na Internet se torna cada vez mais tênue. Saindo um pouco do contexto do livro, tome-se o exemplo mais recente desta extensão para Firefox, cujo objetivo é identificar e reunir dados de perfis de um determinado usuário de uma rede social. Dependendo do quanto de informações o indivíduo disponibiliza online, ainda que em sites distintos, o resultado obtido pode ser uma ficha completa do usuário.
Mesmo aqueles que aparentemente não se preocupam com a privacidade podem acabar se tornando vítimas do sistema. Recentemente, o juiz Antonin Scalia, da Suprema Corte dos Estados Unidos, foi o alvo de estudantes de Direito da Universidade de Fordham. A tarefa, proposta pelo professor Joel Reindenberg, consistia em elaborar um dossiê sobre o juiz, apenas com informações que pudessem ser encontradas online. Os alunos conseguiram levantar 15 páginas sobre a vida pessoal de Scalia, incluindo endereço e telefone pessoal do juiz. O caso pode ser tomado como alerta para se repensar a questão da privacidade online.
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Data venia

Data venia é um termo jurídico absurdo usado nos mais variados contextos jurídicos – de artigos acadêmicos a peças processuais, de aulas de direito a acaloradas sustentações orais em plenário – o qual, apesar de parecer eloquente, não significa absolutamente nada.
Data venia, aliás, data maxima venia, data venia significa sim, alguma coisa. A expressão quer dizer algo como “com a devida licença”, e geralmente aparece antes de se passar a discordar de outrem. Data vem do verbo dar, em latim. Venia significa licença. E o maxima, ao ser acrescentado à expressão, pode servir para intensificá-la.
(Para quem procura uma definição mais séria, vale a pena conferir data venia na Forensepedia.)

Aplicações na vida prática:
– Você é uma pessoa legal, mas, data venia, quando abre a boca só fala asneira.
– Data venia, você não tem razão.
– Data venia, VOCÊ não tem razão.
– Data maxima venia, eu tenho razão sim.
– Data maxima venia, a razão continua comigo.
(repete ad infinitum)

Em tempo: data venia, dedico esta exordial aos eminentes amigos do Plurk.