Monthly Archives: October 2008

Web semântica e jornalismo

Colin Meeks tem feito uma série de textos no Journalism.co.uk sobre como a web semântica pode ser aproveitada por jornalistas. Por lá (ou, mais especificamente, no blog de Colin Meeks no Journalism.co.uk) também estão disponibilizados alguns slides sobre o tema, utilizados em sua apresentação no seminário Journalists and the Social Web, em Oslo.
O potencial da web semântica (ou Web 3.0 para os que gostam de numerar as coisas) para o jornalismo é bem interessante, em especial pela possibilidade, por exemplo, de reunir conteúdos provenientes de fontes diversas (jornalísticas ou não jornalísticas, portais e blogs, redes sociais e microblogs) em um único ambiente, criando verdadeiros canais de informação. Um dos exemplos trazidos por Colin Meeks em um de seus textos é o Twine, que recentemente saiu do beta fechado e passou a ter acesso público. A ferramenta permite agregar conteúdos diversos em canais de informação, e, a partir das atividades do usuário na rede, recomenda novas conexões e novos twines.
Via O Lago.

Assunto paralelo: falando em canais de informação, o socialmedian (aliás, sinto-me meio que uma ilha nesse site, por quase não haver brasileiros), lançou hoje um canal especial para acompanhar as eleições norte-americanas. Há até um widget para sites e blogs (reproduzido abaixo). Além de agregar conteúdos do Washington Post e do The Guardian, também serão disponibilizados por lá tudo o que os usuários do socialmedian compartilharem no Flickr, no YouTube, no Twitter e no Google Reader a respeito das eleições.
O widget:

Desaforamento

Não se trata exatamente da ação ou efeito de cometer um desaforo (ou é isso sim, mas não no sentido usual que se possa imaginar). O desaforamento é um instituto do Direito Processual Penal segundo o qual um julgamento do tribunal do júri (crimes dolosos contra a vida, como o homicídio) pode ser enviado para outro foro (outra cidade) em alguns casos previstos em lei – seria, então, o ato de tirar o processo de um foro e colocá-lo em outro (ou seja, desaforá-lo).
O desaforamento está previsto nos artigos 427 e 428 do Código de Processo Penal. As hipóteses previstas na lei são: interesse da ordem pública (o que, convenhamos, pode abarcar qualquer hipótese imaginável possível!), dúvida sobre a imparcialidade do júri, ou comprometimento da segurança pessoal do acusado. O foro de destino deve ser o da cidade mais próxima do local de onde o processo foi desaforado.
E como isso acontece na prática? Imagine um ilustre morador de uma pequena e pacata cidade do interior (uma pequena e pacata capital é que não iria ser) que por algum motivo qualquer tenha supostamente cometido um assassinato (ninguém é realmente culpado até o trânsito em julgado). Os moradores da cidadela, horrorizados, passam a publicamente repudiar o ato de seu (ex-)ilustre morador, tachando-o como um grande desaforo (esse sim, no sentido usual do termo). Instaura-se um júri para julgar tal habitante, mas, assim como a cidade toda, os jurados também, tomados pela espetacularização do julgamento, já possuem posicionamentos bem definidos contrários ao ato. Nesse caso, pode haver dúvidas sobre a imparcialidade do júri, o que justificaria o desaforamento – ora, se a cidade toda está contra o réu, tolhe-se-lhe qualquer possibilidade de defesa. Aí o processo pode ser remetido para outra comarca, onde o réu será julgado por um corpo de jurados que, com sorte, não estará tão afetado pela aura de revolta dos moradores da cidade de onde partiu o acusado.
Aplicação na vida prática:
– Você pediu aumento de mesada para seu pai, para poder sair mais vezes à noite, mas ele negou, sob o argumento de que meninas não devem sair tanto de casa. Como o posicionamento de seu pai pode ser um tanto viciado, pelo fato de ele ter sido criado em uma sociedade um tanto por demais machista, você pode exigir o desaforamento do pedido de aumento e remetê-lo a sua mãe, que talvez tenha melhores condições de julgar de forma isenta se você merece ou não tal aumento. O mero desaforamento não significa que você irá receber o aumento – apenas que outra(s) pessoa(s) em outro(s) contexto(s) irão julgá-lo.

Afinal, o que é um microblog?

O que é o Twitter? — Sim, eu sei, é um microblog. Mas e o que é um microblog? Um blog pequenininho?
A primeira vez que tentei definir o Twitter, ainda em 2007, saiu assim:

“O Twitter é um microblog. Um microblog é uma ferramenta que permite atualizações rápidas e curtas e, se possível, a partir de uma multiplicidade de suportes diferentes. É possível atualizar o Twitter, por exemplo, pela web, por instant messaging (IM), ou até pelo celular – por short message service (SMS) ou internet móvel.” (daqui).

Apesar de simplória, essa definição já chegou até mesmo a ser descaradamente copiada, com as mesmas vírgulas, sem referência alguma, em um artigo científico de uma desconhecida numa revista acadêmica (mais detalhes sobre esse assunto em posts futuros; aguarde). Mas, sei lá, dizer que um microblog é qualquer coisa que permita atualizações rápidas e curtas é muito limitado, ou não?
Mais adiante, passei a adotar a definição de José Luis Orihuela, segundo o qual o Twitter seria uma mistura entre blog, rede social e mensageiro instantâneo (parti dessa definição neste trabalho, por exemplo). Tentando ampliar as considerações do autor, pode-se dizer que o Twitter seria blog na medida em que envolve a publicação de conteúdo em ordem cronológica inversa. Seria rede social porque nele cada pessoa é representada por um perfil, há uma lista de contatos, e pode-se interagir uns com os outros. Já o caráter de mensageiro instantâneo decorreria da limitação de tamanho a cada atualização, e do fato de que as pessoas costumam ficar bastante tempo online nele, o que faz com que se possa estabelecer conversações síncronas – como numa espécie bizarra de MSN coletivo.
O interessante dessa definição é que ela não se prende a um ou outro aspecto dos microblogs – e sim faz uma analogia com o pouquinho que o Twitter tem de cada coisa.
Só que aí, quando a gente está quase aceitando que o Twitter é isso, eis que surge algo tipo o Plurk. O Plurk foge completamente à idéia do que se imagina para um blog – as postagens são exibidas em ordem cronológica inversa, mas dispostas numa linha do tempo. Onde já se viu, blog em uma linha do tempo??? Por outro lado, há a possibilidade de se responder plurks, o que de certa forma guarda semelhanças com a relação entre postagens e comentários em um blog.
E nessa situação a gente começa a se perguntar até que ponto os microblogs são “micro” e “blogs” mesmo. Ou será que já se tornaram um gênero autônomo, tão autônomo que de blog só possuem o sufixo no nome? E será mesmo que são tão micro? Claro, não dá para escrever um tratado em 140 caracteres. Mas dá para desdobrar uma informação entre vários tweets, ou então vir a complementá-la por intermédio de links para outros textos.
Também não sei por que cargas d’água fui me preocupar logo com isso. Qual a relevância prática de se discutir a definição de um fenômeno? Realmente importa saber se os microblogs são micro, se os microblogs são blogs, ou que raios é isso? As definições, as categorias, são apenas modos de classificar o mundo: ajudam a melhor compreender as coisas. Por outro lado, toda e qualquer tentativa de definição será sempre necessariamente reducionista (lembrando que generalizar é também sempre uma coisa perigosa).
E que tal se a gente definisse microblogs e Twitter como um bebedouro virtual? Como um bate-papo pós-moderno (aliás, o termo pós-moderno, por si só, mereceria toda uma discussão à parte)? Como a versão pública e via web das mensagens de celular? Como uma forma alternativa de representar as coisas? Como uma ferramenta comunicacional peculiar? Como a democratização das frases curtas? Como uma tentativa forçada de reduzir idéias e pensamentos a 140 caracteres – e, dessa forma, ajudar-nos a melhor compreender o mundo?
Alguém aí tem uma idéia melhor de como definir microblogs e o Twitter?
E, só para complicar um pouquinho: o Tumblr é microblog também?

Humanos, máquinas e o CAPTCHA

Com o avanço das técnicas de produção e difusão de informação, novos sistemas informáticos cada vez mais complexos podem passsar a ser empregados para as finalidades as mais diversas, desde a substituição por órgãos humanos até a produção de conteúdo. Ao mesmo tempo que isso abre precedentes fantásticos – como no caso do desenvolvimento da técnica de inteligência artificial, ou na biomedicina – a mesma tecnologia também pode ser empregada de formas maliciosas por pessoas mal intencionadas. E é mais ou menos por aí que surgem os spams nos comentários dos blogs (ok, transição tosca).
Picture 3
Esse CAPTCHA simpático aí de cima aparece no site do Tribunal de Justiça do RS
Uma das maneiras de se evitar uma avalanche de spams em comentários de blogs é o CAPTCHA. O termo CAPTCHA é na verdade um acrônimo (por isso é escrito assim, em MAIÚSCULAS) para Completely Automated Public Turing test to tell Computers and Humans Aparts – sim, isso mesmo, um teste para determinar se você é humano. Por meio de uma pergunta simples (teoricamente simples) e que qualquer humano possa responder, a idéia é que o teste seja capaz de diferenciar homens de máquinas (ou humanos de sistemas automatizados construídos para se passar por humanos). Por conta disso, o CAPTCHA (aquele negocinho que aparece quando se tenta comentar em blogs Verbeat, por exemplo – dá uma olhada ali embaixo, ao final do post, ou então ali em cima, na figurinha) é considerado uma espécie de inversão do teste de Turing, na medida em que se trata de um teste que, ao invés de ser usado por um humano para descobrir se se está diante de uma máquina, é empregado por uma máquina para descobrir se está diante de um humano!
De acordo com o HowStuffWorks, não chega a ser algo tão ruim quando um CAPTCHA consegue ser burlado por spammers, na medida em que, “para um teste CAPTCHA falhar, é preciso que alguém tenha encontrado uma maneira de ensinar a um computador como passar por ele. Em outras palavras, toda falha de um CAPTCHA é de fato um avanço na inteligência artificial”.
Diante de um CAPTCHA, somos levados a refletir sobre nossa condição humana, e o quanto a técnica está impregnada em praticamente todos os aspectos de nossa vida. A presença do CAPTCHA está ali, ao final do formulário, hipermediando o processo, não para que nos irritemos e desistamos de ir adiante, mas sim para nos fazer ver que somos humanos, e, enquanto tais, apesar do embaralhamento das letras, apesar das figuras complexas, apesar dos cálculos bizarros (os Mathematical CAPTCHAS), apesar dos sons desfigurados, apesar de tudo, ainda cremos sermos capazes de dominar a máquina superar o CAPTCHA e ir adiante em nosso rumo. (Claro que, idealmente, bem que os sites não precisavam exagerar na dose – aliás, será que um dia precisaremos chegar a este ponto?)