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Ainda em clima de Natal

Querido Papai Noel,
Sei que não me comportei muito bem este ano, mas, mesmo assim, gostaria que o senhor me desse um presente. Não é nada muito grandioso, mas também talvez não seja algo assim tão simples. Pode ser que esteja um pouco fora de seu alcance (e também não sei como fazer para passar isso por uma chaminé, ou por debaixo da porta), mas pelo menos não é algo que interfira no orçamento geral dos presentes para o Natal. Sei que sobra pouco dinheiro para presentear cada criança em todo o Natal, e também que a fábrica dos duendes na Lapônia no Quirguistão é incapaz de produzir brinquedos para todo o mundo – mesmo que eles trabalhem arduamente durante o ano inteiro. Sei também que meu pedido está chegando um pouquinho atrasado, e de repente meio fora da apertada rota de entrega de brinquedos para o Natal. Por conta disso, tive o cuidado de escolher algo que beneficiasse não só a mim, como também a milhares de outras pessoas – e também ao senhor, Papai Noel. Diferentemente de uma bola, boneca ou bicicleta, talvez meu presente nem precise de embalagem – talvez um frasco, ou um cartão em um envelope simbólico possam servir de indício de que o presente foi enviado. Também dá para economizar com transporte, e fazer tudo pela Internet – afinal, vivemos em uma sociedade permeada pela tecnologia. Basta um e-mail. E não precisa nem ser enviado pelo senhor, Papai Noel. Se estiver sem tempo, o senhor pode confiar a tarefa a um de seus milhares de assessores duendes lá da fábrica de brinquedos.
O que quero é mais tempo. Mais tempo para poder desfrutar dos pequenos prazeres da vida, sem a pressa inerente ao dia-a-dia agitado das grandes cidades. Mais tempo para poder apreciar uma xícara de chá, ou poder ler um livro inteiro, do começo ao fim, sem precisar ter que se preocupar com a próxima reunião, com o próximo compromisso. Mais tempo para que as crianças possam brincar sem se preocupar com a violência nas ruas, para que os pais possam curtir seus filhos, sem que isso prejudique o sustento financeiro da família. Mais tempo para poder ficar alguns minutinhos a mais na cama ao acordar, apenas para traçar planos para o dia que se inicia. Mais tempo para trabalhar, mais tempo para esperar, mais tempo para experimentar, mais tempo para viver.
Quero apenas poder viver em um mundo menos acelerado; ter a expectativa de acordar pela manhã rumo a um novo dia – rumo ao desconhecido. E não todo dia, ao ouvir o ronronar do despertador, deparar-me com a tediosa rotina apressada de sempre, em que, embora haja muitas coisas por fazer, fazem-se sempre as mesmas coisas, o que leva à impressão de que o tempo simplesmente não passa. Talvez o problema nem diga respeito tanto à quantidade de tempo disponível, e sim a uma questão de logística, em relação à forma de distribuição entre atividades e tempo – o que, ao menos em tese, torna a viabilidade do presente um tanto mais simples.

Feliz Natal a todos! 🙂

E vocês sabem, não, que o Natal quase foi cancelado porque o helicóptero em que o Papai Noel estava foi atingido por dois tiros ao sobrevoar uma favela no Rio de Janeiro, uma semana antes do Natal?

Construindo uma máquina do tempo ideal

Reflexões surgidas após a leitura do conto “All you zombies” de Robert A. Heinlein, e de algumas considerações acerca do Paradoxo do Avô.

Considerações iniciais

Uma máquina do tempo ideal deveria permitir movimento apenas no tempo, e não no espaço. Para viajar no espaço a gente tem carro, foguete, lancha, balão, bicicleta. O que falta é um dispositivo que permita “viajar” (por falta de um termo mais apropriado) por horas, semanas, meses, decênios, milênios. E não da forma unilateral que se faz quando se mergulha em recordações de um passado vivido, contado ou imaginário (ou acaso alguém esteve na Idade Média para saber como ela realmente era?).

Da importância da construção da cabine

Como ficou decidido que a movimentação se dará apenas no tempo, e não no espaço, faz-se necessária a construção de uma espécie de cabine que permita tal deslocamento. A cabine deveria ser pequena (para uso individual, provavelmente) e feita de um material firme e forte, que resista à ação do tempo (sem ironias).
A pessoa entra na cabine no momento em que está, e sai algum tempo antes no mesmo lugar (para deslocamentos no espaço, consulte o item Máquina do Tempo X Teletransporte). Para pequenas distâncias no tempo, a “viagem” seria tranqüila. O problema é com futuros longos retrocessos no tempo, o que talvez fosse requerer que a cabine seja de um tamanho e formato confortáveis. Considerando-se a necessidade de que a cabine tenha existência tanto no tempo de onde se parte quanto no momento de destino, as longas “viagens” apenas se processarão daqui alguns anos (isso se a máquina for efetivamente implantada e produzida mais ou menos por agora). Mas, em termos simples e lógicos, voltar uma semana no tempo para tentar compreender um pequeno mal entendido é rápido. Mas se alguém que esteja em 3417 resolva voltar ao ano de 2006 para tentar compreender como se deu a construção de determinado dispositivo da máquina do tempo, aí com certeza a “viagem” vai ser bem mais demorada.

O quanto demorada vai ser a “viagem”

Por uma decisão completamente arbitrária (este post trata da construção da minha máquina do tempo, portanto, reservo-me no direito de decidir de forma totalmente aleatória tudo o que concerne ao funcionamento da minha hipotética máquina do tempo), e fazendo analogia com distâncias físicas, cada minuto deslocado no tempo corresponderá a 1 metro. Para fins de cálculo do tempo, considerar-se-á apenas o tempo de deslocamento real, desconsiderando-se os tempos de desintegração e reintegração da matéria (cf. item “Conversão da matéria em luz” abaixo).

Máquina do tempo X Teletransporte

Antes de prosseguir, convém lembrar que o mesmo princípio de desintegração e reintegração da matéria poderá ser adotado na construção de uma máquina de teletransporte (mas aí se estaria falando em uma “máquina do espaço”, o que de certa forma foge à temática proposta neste post). Mas já adianto: o esforço teórico para a construção de uma máquina de teletransporte é completamente inútl, pois para isso (deslocamento no espaço) já dispomos de diversas bugigangas semoventes que desempenham tal função de forma satisfatória, embora em velocidades bem menores do que o que se gostaria. Assim, o caminho para que se atinja uma melhora no deslocamento espacial não é investir no teletransporte, e sim tratar de garantir que a velocidade dos atuais meios existentes seja aumentada.

Conversão da matéria em luz

Tendo sido feita a distinção entre máquina do tempo e máquina do espaço (teletransporte), o passo seguinte seria determinar como se dará a desintegração da matéria. Uma saída prática seria converter a massa do indivíduo que pretende se deslocar no tempo em luz, haja vista a extrema velocidade que a luz é capaz de atingir (ressalte-se novamente que o mesmo princípio também poderia ser adotado numa infrutífera máquina de teletransporte).

A velocidade da luz

A velocidade máxima que a luz pode atingir é de 1 800 000 000km/h, ou seja, 300.000km/segundo. Mas aí tem toda aquela história da teoria da relatividade que diz que a massa do objeto que chega perto da velocidade da luz e a percepção do tempo de quem está em tal velocidade acabam sendo alteradas. A massa reduz, o tempo encolhe. Daí a máquina do tempo necessariamente teria que ter um dispositivo que permitisse corrigir tal falha. Esse é um detalhe que deverá ser trabalhado com o tempo. Por ora, vale fazer como nos exercícios de física do Ensino Médio e partir do pressuposto de que todos os dados complicados poderão ser desconsiderados (“despreze a gravidade, ela é inútil e tem um valor muito complicado”) em nome de uma possível reflexão teórica distanciada acerca do caso.
Entretanto, uma consideração importante que não se pode deixar de fazer neste momento é a necessidade de parcimônia para a utilização da máquina do tempo. Ora, se a conversão causa mudanças de ordem física e temporal, é lógico deduzir que seu uso prolongado possa causar sérias conseqüências. Este assunto poderá ser retomado em futuras considerações teóricas acerca da construção da máquina do tempo. Fica o convite para eventuais pesquisadores e interessados no tema possam desenvolvê-lo via comentários.

Tabela 1 – Proporções tempo – minutos

tempo minutos
1 dia 1.440 minutos
1 semana 10.080 minutos
1 mês 43.829 minutos
1 ano 525.948 minutos

Cálculos

Logo, na razão de 1 metro por minuto que se queira retroceder no tempo, convertendo a massa em luz, tem-se que:
1 ano = 525 948 minutos.
525 948 minutos = 525 948 metros
525 948 metros = 525,948 km
A uma velocidade de 300.000km/s, seria possível retroceder 1 ano no tempo em menos de 1 segundo (0,0017 segundos). Nessa mesma proporção, uma viagem de 40 anos no tempo (de 2046 para 2006, caso a máquina seja construída ainda este ano), levaria um pouco mais de tempo, mas mesmo assim se manteria em menos de 1 segundo (0,7 segundos). A velocidade seria apenas significativa para trajetos que envolvessem mais de 300.000.000 metros, o que se daria em mais de 570 anos. Como esta não deve ser uma preocupação de alguém que exista em 2006, deixaremo
s essa reflexão para nossos descendentes, e vamos logo ao que interessa.

Da impossibilidade de se alterar o passado

Alterar o passado poderia ter conseqüências drásticas (tipo Efeito Borboleta, teoria do caos… mexe num detalhezinho e teu futuro muda drasticamente… tanto que tu podes nem mais existir nele – vide Paradoxo do Avô). Logo, o retorno no tempo deveria apenas permitir que se assistisse, como mero espectador, aos acontecimentos do passado.
Não haveria problemas em alguém se assustar ao se deparar com uma versão de si mesma alguns anos mais velha circulando por aí, pois todos do passado “revisitado” saberiam da existência da máquina do tempo, já que a cabine precisaria existir em tal tempo para permitir o “deslocamento” temporal. Mas para evitar confusões e mal-entendidos, o ideal seria que a versão do corpo que retorna ao passado seja mais ou menos fantasmagórica (e decididamente invisível).
Outra questão importante é decidir se a pessoa vai com a idade que tem, ou com a idade que tinha (e, consequentemente, com o grau de julgamento da idade que irá revisitar). Há dois aspectos a serem observados: (1) de nada adiantaria, por exemplo, poder retornar ao passado para avaliar com distanciamento crítico uma determinada ação, se não se pudesse utilizar dos conhecimentos adquiridos ao longo do tempo para poder refletir com maiores subsídios e tentar alterar o futuro (já que o passado é inalterável); e (2) se a pessoa vai ao passado, como mero espectador (sem poder interferir nos eventos), nada mais lógico que se vá com a idade que se tem no momento em que se entra na máquina (e não com a idade que terá quando observar-se ao sair dela).

Finalidade prática da máquina do tempo

A utilização prática da máquina, ao menos em tempos em que estejamos vivos (considerando-se a construção da máquina em 2006, e uma expectativa de vida média de 71,3 anos para um brasileiro), será apenas para rever acontecimentos dos quais tomamos parte e durante os quais estivemos vivos. Sua finalidade principal seria permitir que as pessoas revejam suas atitudes e reconsiderem seus posicionamentos.

Conclusão inexorável

A máquina do tempo já existe, sob diversas formas e para diversos usos: máquina de fotografar, máquina filmadora, blogs. Tudo são próteses que nos ajudam a revisitar o passado em momentos de dúvidas. Mas não dá para se prender a ele: o presente está aí, para ser vivido. E o futuro chega a todo momento. Então, qual o sentido de se querer tanto ir de volta ao passado?

(Postado originalmente em 11/06/2006. — Sim, é um calhau!)

Em tempo: sei que o texto está no mesmo blog e nem faz tanto tempo assim que foi postado pela primeira vez. Mas resolvi pegar onda no Anônimo pára-quedista do Google que comentou no texto hoje, e colocá-lo neste espaço novamente. Esse mesmo post acabou dando origem, meses mais tarde, ao meu primeiro atentado literário pseudo-transfigurado na forma de livro novela PDF.

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O tempo, sempre o tempo

O tempo não é divisível como o espaço. Isso deveria soar óbvio, banal, totalmente compreensível. Deveria. Mas talvez essa seja mais uma daquelas coisas que a gente precisa batalhar para se convencer de que é assim. Algo que, na prática, nem sempre coincide com a teoria. (Algo parecido acontece com a nossa idade. Decoramos um número aleatório, que precisamos manter em mente por 365 dias, quando, na verdade, mudamos de idade a cada dia).

Tentamos o tempo todo fragmentar e compartimentar o tempo em unidades autônomas. Buscamos adaptar nossas atividades ao (espaço de) tempo disponível. Deveria ser o contrário: o tempo a determinar nossa rotina. Com tudo isso, não percebemos que o tempo é, de fato, algo único, contínuo, experienciável, não-tangível (o agora já passou antes mesmo do instante de pronunciá-lo), não divisível, enfim, simplesmente ‘vivível’.

O tempo não é um conjunto de espaços a preencher. O tempo é um caminho que leva a lugar nenhum. A gente segue, caminha, vai para frente. Mas nunca chega, nunca termina. O tempo é, apenas isso. Ele é, sem complementos. Ele é, sozinho.

Não é como uma torta que se divide em fatias. O tempo é fatal e imprevisível. Assim como uma sexta-feira à noite, como um temporal, como uma foto espontânea, como a reação de um gato arisco. Não há como fixar com precisão nem sequer um único instante. Até mesmo uma foto reflete necessariamente uma única faceta da vida (um tempo, um espaço, um ângulo, uma perspectiva). Nem mesmo a divisão do espaço consegue ser inteiramente absoluta, pois há áreas que pertencem a todos, por absurda ficção jurídica.

Apesar de tudo, o tempo passa. O tempo avança, determinado, irrepetível (embora cíclico, embora sensível). O amanhã parece se situar em outro tempo, em outro espírito, mesmo que na prática tudo faça parte de um mesmo continuum.

A divisão excessiva do tempo em espaços leva a experiências efêmeras. Não sobra tempo para reflexão. As atitudes são impensadas e as respostas, irrefletidas. Toma-se conhecimento dos fatos, mas não se absorve nada a partir disso. Na correria, mal sobra tempo para se suspender um suspiro…

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Mais tempo

Em um mundo ideal, os dias teriam mais horas, ou as horas levariam mais tempo para passar. Ou as duas coisas ao mesmo tempo. E o tempo livre seria usado para atividades lúdicas, voltadas ao lazer – jamais para trabalhar mais.

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