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Jornalista pode falar qualquer coisa no Twitter?

Recentemente, dois jornalistas do Grupo Folha foram demitidos após trocarem impressões sobre uma cobertura em seus perfis pessoais no Twitter. Até que ponto se estende o alcance da organização? O jornalista segue sendo jornalista mesmo em um perfil pessoal em um site de rede social? Uma demissão nessas circunstâncias se justifica?

Os dois jornalistas usaram o Twitter para comentar sobre a cobertura jornalística da morte de José Alencar. Dentre outras coisas, mencionaram que a Folha.com demorou muito para publicar a notícia (o que de fato aconteceu), talvez receosos de errar de novo. Em certo ponto, chegaram a mencionar um caso recente, em que a Folha.com anunciou a morte do senador Romeu Tuma cerca de um mês antes de ele morrer. (Aliás, o caso Romeu Tuma foi tão emblemático que virou até tema de dissertação: a minha. Mais ainda: cheguei a entrevistar o então editor adjunto da Folha Poder, que parece ter sido um dos dois jornalistas demitidos recentemente.)

A ombudsman da Folha resolveu tocar no assunto na coluna deste domingo (mais detalhes aqui e aqui). A crítica se dirigia em especial ao fato de os jornalistas terem dito publicamente que o obituário de personalidades famosas costumam ficar prontos com antecedência, apenas esperando o momento certo de serem publicados. Ei, mas espera aí, algum leitor se sente ofendido ao ficar sabendo disso? (Algum leitor não sabia disso ainda????) Ou já não era de se esperar que já se tivesse dados prontos para quando alguma personalidade pública morresse? (Ou acaso alguém preferiria que uma nota de falecimento de uma grande personalidade pública levasse horas e horas para ser produzida?)

Poucos dias atrás, por exemplo, quando a atriz Elizabeth Taylor morreu, ficamos sabendo que seu obituário no The New York Times havia sido escrito por um jornalista que já morreu há 6 anos! E essa informação consta no próprio rodapé da nota.

Esse não é o primeiro caso de demissão de jornalista por algo que disse no Twitter, e provavelmente não vai ser o último. No ano passado, um jornalista da National Geographic foi demitido por criticar a revista Veja no Twitter. Pouco tempo depois, a Editora Abril elaborou um adendo a seu manual de condutas éticas, tratando de posturas éticas em redes sociais. Outras empresas também possuem recomendações sobre o tema, formais ou informais.

Toda essa discussão levanta a questão de que até ponto um jornalista vinculado a um veículo (ou, indo além, qualquer profissional de qualquer organização) tem liberdade para falar sobre o que quiser no Twitter – especialmente, para criticar o trabalho desempenhado pela própria empresa em que trabalha. Ainda que se trate de um perfil pessoal, uma pessoa pública como um jornalista é associada à imagem da empresa para a qual trabalha. Por outro lado, impedir que o indivíduo emita suas próprias opiniões pode caracterizar um cerceamento à liberdade de expressão.

Os veículos podem censurar seus funcionários? Os jornalistas podem falar o que quiser nas redes sociais? Não tenho uma opinião formada, mas talvez um meio termo baseado no bom senso possa ser um bom caminho…