A (estranha) percepção da passagem do tempo

Parece que quanto mais o tempo passa, mais rápido parece ele passar. E o pior de tudo é que há uma explicação lógica e possível para tal. Há quem diga que quando somos crianças a gente sente que tem mais tempo porque tudo para nós é novo. Cada nova experiência é aproveitada até os últimos instantes, até deixar de ser novidade, e isso nos faz ter a sensação de que o tempo está demorando para passar (já que cada ato é uma novidade, e temos toda aquela ânsia de querer aprender como desempenhar a tarefa nova de forma adequada).

Com o passar do tempo, as novidades em potencial começam a diminuir em nossas vidas. A escola se torna repetitiva. Até as festas, em um determinado momento, tornam-se repetitivas. Tudo o que é repetitivo leva à monotonia. E a monotonia nos faz pensar que o tempo não passa: se arrasta.

O inverso também pode ocorrer: nos enchemos com tanta tarefa que a gente nem sente o tempo passar; ele simplesmente passa, independentemente de nossa vontade.

De um jeito ou de outro, aquele aspecto de novidade que permeia as nossas vidas nos anos iniciais vai aos poucos se esvaindo, e, sem a idéia de ineditismo, nossas ações se tornam repetitivas, monótonas e aceleradas. Tudo igual, sempre.

Um dos grandes motivos para nos fazer achar que o tempo passa mais rápido quando crescemos é a inevitável aceleração decorrente da automatização das tarefas do dia-a-dia. Há um sem fim de coisas que fazemos automaticamente e só muito raramente paramos para pensar se realmente foram feitas. Voltamos do elevador até a porta para nos certificar de que a fechadura foi trancada. Retornamos à cozinha horas após o jantar só para ter certeza de que o forno foi desligado.

Essa automatização deriva do aprendizado. Enquanto aprendemos alguma coisa, ela é novidade, e, portanto, sujeita a uma passagem do tempo mais leve, mais sutil. Depois que a coisa já está devidamente aprendida, e se temos que repetir a tarefa seguidamente, ela será feita quase que automaticamente. Repetição mecânica. Eliminação total da criatividade. É mais fácil seguir a mesma técnica de sempre, aquela fórmula que já deu certo, do que (tentar) inovar a todo momento. (A culpa é nossa, por mero comodismo?)

Será que se chegará a um ponto em que a criação intelectual também será assim? E a produção de notícias? Sempre os mesmos fatos, sempre as mesmas perguntas a serem respondidas na notícia (o quê, quem, a quem, onde, quando, por quê, como, e o que isso tem a ver com a minha vida?), sempre as mesmas tragédias, sempre os mesmos crimes (quem veio primeiro: o crime ou a lei que o determina?), sempre os mesmos eventos (apenas com periodicidades variadas), sempre os mesmos fait divers. Sempre os mesmos temas, sempre as mesmas postagens, sempre os mesmos comentários, sempre os mesmos blogs. Anulação total da subjetividade? Estamos todos condenados a nos tornar máquinas de repetição, programadas para não ter sentimentos, porque sentimento implica em novidade, e novidade faz o tempo passar mais devagar? Estamos condenados a fazer sempre as mesmas coisas? A repetir os erros do passado? A viver sempre igual e de forma cada vez mais rápida?

Com o tempo passando lentamente, apreciamos mais a vida. Mas não produzimos. Produzir implica necessariamente em acelerar. Somente com a exigência da velocidade chega-se à alienação. E somente com a alienação é que se produz. Ciclo vicioso, cadeia sem fim.

Assim, cada vez mais o tempo nos impõe novas tarefas repetitivas, de modo que não sobre tempo para sentir. Também não sobra tempo para ver o tempo passar. E o resultado disso tudo é uma total insatisfação com o ritmo da vida. Estamos condenados a viver entre este e o próximo deadline? Estamos condenados a ser eternos escravos do tempo?

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