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Chá milagroso

Já ouviu falar no chá que cura tudo quanto é doença? Vejamos o que diz na embalagem de uma dessas maravilhosas soluções para todos os seus problemas:

Obs.: Texto de embalagem real. A marca do produto será preservada. A intenção não é falar mal do produto, e sim reproduzir as informações constantes no verso da embalagem do chá.

Primeiro, as indicações: “O chá ##### é indicado para as várias doenças como o câncer no seio, estômago, pulmões, ovário, útero e outros”. Cura milagrosa, não? Felizmente, na embalagem não consta qual o efeito que o chá produz com relação a esses tipos de cânceres. Apenas diz que é indicado para tais casos. Até aqui, tudo bem. Não se pode dizer que se trata de propaganda enganosa. Vamos adiante. “O chá elimina o excesso de colesterol; dissolve coágulos de sangue, placas de gordura, curando a trombose; desobstrui as artérias bloqueadas evitando a ponte de safena”. Aleluia, irmão! (Okay, sem comentários maldosos). Seguindo: “Pressão alta, tonturas, insônia, bronquite asmática, doenças respiratórias, enxaqueca, sinusite, e problemas do sistema nervoso”. Uma frase sem sujeito. O objetivo era enumerar doenças aleatoriamente? Parece que conseguiram. “Cura o fígado, hepatite, diabetes, úlceras, gastrite, intestino preso, infecções nos rins, ovário, na bexiga, feridas no útero e corrimento”. Milagre!!! “É eficaz na cura do mal de chagas, dores na coluna, nas juntas do corpo, reumatismo no sangue e outros; envenenamento por agrotóxicos, alergias, feridas por difícil cicatrização, varicoses, flebites, enfisema pulmonar, anemia, cirrose hepática, mal de Parkinson, próstata, doenças mentais e nervosa”. Alguém já avisou o Michael J. Fox de que encontraram a cura para o mal de Parkinson? Ou melhor, o chá não cura; apenas é eficaz no processo de cura… Seria injusto acusá-lo de prometer a cura dessas doenças (as doenças que ele cura sozinho estão enumeradas na frase imediatamente anterior). Ou seja: basicamente, o chá oferece alguma espécie de alívio para praticamente todas as doenças.
Como funciona? É simples, basta colocar “uma colher (de sopa) rasa do pó, em dois litros de água, levar ao fogo e ferver durante um min., assim se tiver algum micróbio será iliminado (sic)”. O chá tanto pode ser ingerido quanto, em caso de feridas, servir para lavar a região atingida.
Qual a quantidade que deve ser ingerida? A embalagem informa que “Quanto mais tomar melhor o resultado”. Efeitos colaterais também constam nas letrinhas miúdas da embalagem: “Nos primeiros dias para os que tem problema de estômago e intestino pode provocar diarréia; não se preocupar é sinal de que a cura está se processando. Não ligar para a reação, ele é diurético, tem muitas propriedades medicinais a (sic) faz efeito rápido em todas as doenças”.
Por quanto tempo deve durar o “tratamento”? “Nos casos mais graves e crônicos, usar durante 60 dias, mas todos deveriam tomar durante 30 dias para purificar o sangue e para prevenir e curar outras doenças”.
Mas o chá não é de todo mau. Há a recomendação de que se consulte um médico: “Controlar a melhora do estado de saúde, e quando restabelecida procurar seu médico sobre o uso ou não de remédios”.
Por fim, há uma enigmática recomendação final: “Ao deixar de tomar remédios, é recomendado tomar o chá, por um período para a prevenção de cura conseguida com o tratamento”.

Está duvidando? Nesta página há informações sobre o mesmo chá, mas produzido por outra empresa. Este outro possui uma descrição parecida, mas corrige alguns dos excessos cometidos pela embalagem que tenho em mãos.

Não há mal nenhum em acreditar em homeopatia (que, na verdade, cura pelo lado psicológico, porque o remédio, na verdade, não é remédio, mas fazem com que se acredite que seja, e essa crença é suficiente para que a cura seja atingida). O problema é quando exageram. Enfim, todos são livres para acreditar que o chá realmente é capaz de curar toda as doenças. Cada um com suas crenças, acredite quem quiser…

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A espetacularização da tragédia

Um fato inusitado, um acontecimento não-programado irrompe na seqüência tradicional do dia-a-dia. Quanto mais esse fato for raro, quanto mais pessoas atingir, quanto maior interesse for capaz de despertar, mais facilmente reunirá as condições necessárias para ser transformado em notícia.

Na tragédia, vários valores-notícia são reunidos. Tem-se a idéia de raridade (expressa pela simplista máxima jornalística que diz que se um cão morde um homem não é notícia, mas se um homem morde um cão, pela improbabilidade do fato, isso se torna notícia), tem-se interesse (o mórbido interesse humano pela tragédia), tem-se imagens impactantes (principalmente para o caso da transmissão televisiva). Pode-se ter ainda a idéia de proximidade (para quando o fato acontece nas imediações do local para onde é noticiado), e até mesmo a quantidade (é diferente quando afeta um ou um milhão) e a qualidade (se acontece com alguma celebridade, algum político, ou com pessoas comuns) das pessoas envolvidas. Basicamente, tudo é valor quando se trata de mensurar a curiosidade humana.

(Por que os conflitos no Iraque não geram tanta comoção? Porque lá é rotina (ou ao menos é assim que a mídia nos faz sentir que seja), e também porque falta proximidade. É tão remoto, é tão distante, e parece ser tão comum, que a sensação que se tem é que foram meras fatalidades sem importância. Morrer no Iraque é banal. Há um jornalista que chegou a sistematizar e quantificar, brincando, o número de mortos necessários para que uma tragédia mereça destaque nos telejornais. O grau de interesse possível era medido não só com base na quantidade de pessoas envolvidas, mas também no tipo de pessoas. Não lembro das exatas medidas (nem do autor da brincadeira), mas seria algo como cinco americanos, dez europeus, cem latino-americanos, quinhentos asiáticos e mil africanos as quantidades mínimas de mortos ou feridos para que o fato recebesse relevância na mídia norte-americana.)

Uma tragédia causa comoção, desperta emoção, o clima de tensão contagia. Mas o que a mídia faz ao noticiá-la vai além. Ela espetaculariza. A tragédia de poucos é transformada em um espetáculo para muitos. É como se a dor dos familiares das vítimas fosse produzida para ser compartilhada com os milhares de espectadores.

Todos vão morrer algum dia. Mas espera-se que seja de uma forma pacífica, planejada, preparada, e não de um modo brusco e sem explicação. A morte trágica inverte a ordem natural das coisas. É insólito, é exceção. A vida sendo abreviada de forma trágica e repentina é um filão comumente explorado pela mídia, porque vende. Principalmente quando a tragédia é próxima.

As tragédias despertam tanta atenção dos espectadores porque, de certa forma, fazem com que as pessoas que escaparam se sintam bem por estarem vivas. Faz com que as pessoas simplesmente se sintam vivas. E esse sentimento só aflora por exceção. A gente só sente que está vivo quando alguém nos chama a atenção para esse fato. Viver é como respirar: a gente faz, mas nem sempre tem consciência disso.

O pensamento mais comum que se tem diante de uma tragédia é que se poderia estar ali. Mas não foi a nossa vez. Foi a vez daquele infortunado que estava na hora errada no lugar errado, daquele que teve azar de estar envolvido. E o azarado é usado como exemplo, como um infortunado exemplo de que a fatalidade acontece, de que a vida é curta, de que nossa existência é sutil.

* Reflexões desencontradas surgidas a partir da excessiva cobertura televisiva sobre a tragédia do metrô de São Paulo. Nesse caso, além de espetacularização, há também o gerundismo (o fato é mostrado enquanto está acontecendo).

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OAB Recomenda / layout blog

O curso de Direito da UFPel está na lista de recomendados pela OAB deste ano. Yay.
Não sei se o curso estava na lista do ano passado, ou na do anterior, só sei que quando ingressei no curso, em 2004, o Direito da UFPel era o único curso de Direito de universidade federal do Rio Grande do Sul que não constava na lista de recomendados pela OAB. Basicamente, ter sido incluído na lista significa que o curso está melhorando 😀
Segundo o Conjur, o selo “OAB Recomenda” é emitido uma vez ao ano pela Ordem dos Advogados do Brasil para os cursos de Direito com melhor desempenho nos anos anteriores.

Atenção – mudança brusca de assunto a seguir:

Na falta do que fazer, tentei criar um novo visual para este blog. A mudança é sutil, os elementos permanecerão os mesmos. O resultado até então, tosco e esquisito, pode ser conferido aqui. Aceito sugestões e críticas para melhorá-lo. Vale esculhambar, aqui ou lá. Meu senso estético é terrível. E, como não estou no meu computador, todos os elementos foram criados ou adicionados pelo incrível Paint e pelo maravilhoso Bloco de Notas do Windows. E olha que consegui até criar um pseudo-efeito de sombreado no título do blog! 😛 (escrevendo a mesma palavra duas vezes com duas cores e quase sobrepondo uma escrita sobre a outra). Os ícones e imagens foram encontrados via Google.

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Pérolas midiáticas

A novela das 8 está se superando cada vez mais. Como se não bastasse reunir as piores cenas de filmes de terror em um só capítulo (que foi ao ar na semana passada e continha preciosidades como um relógio com ponteiros girando adoidados, guardanapo pegando fogo sozinho sobre o fogão, o reflexo do fantasma de Nanda vestindo camisolão branco aparecendo para Helena no espelho, vultos que passam correndo, porta-retratos que quebram e desquebram, e músicas que tocam sozinhas), o capítulo de hoje (ou ontem, dependendo da concepção de dia que se adote) trouxe uma entusiasmante aula de Direito de brinde. Na cena, Helena (nome recorrente nas tramas repetitivas de Manoel Carlos) estava à mesa com seu filho adotivo. Os dois conversavam sobre a possibilidade de Helena vir a perder sua filha (também adotiva) Clara na Justiça. Eis as palavras de Helena (numa transcrição não totalmente literal, porque a cena foi vista com desatenção, mas procurando ser fiel à idéia central do que foi dito):

“Não se pode esquecer que o juiz que vai decidir o caso é um homem, ou uma mulher, como todos nós. Ele ouve as partes, mas dá a sua decisão pessoal”.

Arrã. O juiz é completamente arbitrário. Ele pode tudo. Não existe direito, não existe lei. Não sei o que estou fazendo em um curso de Direito.

Em tempo: o juiz dá, sim, a sua decisão. Mas ele não pode decidir de forma totalmente arbitrária, de acordo com suas convicções. Pode-se dizer que a decisão, de certa forma, é discricionária, no sentido de que ela não pode se dar contra a lei – mas, dentro dos limites impostos pela lei, o juiz é livre para decidir como quiser. A motivação da sentença (baseada na lei, e não exclusivamente em critérios subjetivos) é obrigatória. Tanto é assim que a decisão contrária à lei pode ser recorrida (daí se diz que no Brasil vigora o duplo grau de jurisdição).
(Os jurados, por sua vez, podem decidir como bem entenderem. E a decisão deles é vinculante. Mas eles só entram em cena no julgamento de crimes dolosos contra a vida, o que não tem absolutamente nada a ver com o caso em questão.)

Essa pérola é mais uma demonstração do quanto a mídia contribui para emburrecer o cidadão. Nesse caso, felizmente, tratava-se da mídia de entretenimento. Não foi culpa do jornalismo.

(e a fala provavelmente não tenha sido escrita com a conotação que aqui descrevi, mas, enfim…)

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Por que o iPhone é uma revolução

Vários aspectos chamam a atenção no iPhone, o celular revolucionário combinado com iPod da Apple. Mas talvez a principal revolução provocada por esse aparelho, que chega às lojas dos EUA na metade deste ano (por U$499 na versão de 4Gb, ou U$599 na de 8Gb) é o fato de que essa invenção pode ser considerada a precursora de uma provável futura revolução na relação do homem com a tecnologia.

Geralmente as experiências tecnológicas são capazes de mobilizar apenas dois sentidos: a visão e a audição. A primeira grande inovação do iPhone reside no fato de que ele altera totalmente a maneira de o homem interagir com a tecnologia. Com ele, também se utiliza um terceiro sentido: o tato. Todos os comandos são acessáveis a partir de toques sobre a tela. Muitos movimentos análogos ao que se faria em um “mundo real”, passíveis de serem descobertos de maneira quase sensitiva, são também utilizáveis para realizar tarefas como diminuir ou aumentar imagens (basta fazer um movimento de pinça com os dedos), centralizar a imagem (um toque central é suficiente para resolver o problema) ou mudar a orientação da tela do aparelho de vertical para horizontal (basta fazer o que se faria com uma simples fotografia de papel: para ver na vertical, é só segurar o telefone nesse sentido; para ver na horizontal, é só virar o telefone de lado).

Outra grande novidade diz respeito à integração com o iPod. Não que os outros telefones também não sirvam para tocar música (muitos dos modelos atualmente disponíveis no mercado são capazes de realizar muitas das funções de um tocador de mp3), mas o diferencial é que se tem uma verdadeira hibridização: diferentemente dos demais modelos de celular, o aparelho da Apple promete desempenhar de maneira satisfatória as duas funções (a de telefone e a de tocador de música). Como tudo funciona à base do toque, para escolher a música que se quer ouvir basta deslizar os dedos sobre as imagens de capas de CDs referentes às músicas disponíveis no aparelho. Simples, assim.

A tecnologia do toque é defina pela Apple como a interface mais revolucionária desde o mouse. Tudo no aparelho é controlado pelo toque dos dedos. O telefone tem também vem com tudo aquilo que normalmente se espera de um telefone hi-tech de última geração, como Wi-Fi, câmera de 2 megapixels, bateria com duração de 5 horas em uso (ou 16 horas para música), dimensões reduzidas (115 por 61 centímetros) e peso de 135 gramas. A tela é de 3.5 polegadas. Além disso, o aparelho também possui facilidades para o acesso à Internet, como um superteclado (na tela e à base de toque, obviamente) capaz de prever o que se vai digitar, a possibilidade de aumentar o zoom das páginas da web acessadas pelo telefone, e a capacidade de se acessar e-mails e páginas da web ao mesmo tempo.

Em suma, esqueça tudo o que você sabe sobre telefones celulares. O iPhone simplesmente redefine a noção de telefone.

Espera-se que no futuro cada vez mais os “telefones” pareçam versões miniaturizadas de computadores, e cada vez mais, tanto computadores quanto telefones, possuam interfaces cada vez mais sensitivas, amigáveis e fáceis de usar. Para que complicar o que pode ser fácil? Ultrapassada a fase das descobertas, a tendência agora é agregar a maior parte de funcionalidades em um só aparelho. Aos poucos, a experiência do ser humano com a tecnologia estará sendo reinventada.

Talvez, como disse Nicholas Negroponte, os átomos estejam realmente sendo substituídos por bits. O futuro tende a ser cada vez mais digital.

Em tempo: enquanto toda essa revolução tecnológica se articula, como é que ficam as relações interpessoas não-mediadas por dispositivos tecnológicos? Em outras palavras, será que não se está preocupado demais em desenvolver a tecnologia e se deixando de lado a qualidade, a quantidade e a intensidade das interações face a face?

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Curiosidade inútil

Esses dias, assistido ao filme “The Dead Zone” (1983), deparei-me com a seguinte afirmação, feita pelo personagem interpretado pelo ator Martin Sheen, um inescrupuloso candidato ao Senado dos Estados Unidos:

“Tive uma visão de que um dia eu serei presidente dos E.U.A. E aceitei essa responsabilidade. Por isso, ninguém, ninguém vai me impedir.”

Pelo visto, ninguém conseguiu impedi-lo. Anos depois, Martin Sheen interpretaria o presidente dos Estados Unidos na série “The West Wing” (1999-2006).

No filme, o personagem de Martin Sheen, felizmente (só vendo o filme para entender), não consegue se eleger senador.



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Censura virtual

Definitivamente, a Justiça brasileira e as celebridades-em-fim-de-carreira não têm a mínima noção de como funciona a Internet. Cicarelli censurou o YouTube. E Barichello tem a pretensão de censurar comunidades do Orkut. Felizmente, ao contrário do que aconteceu no YouTube, na decisão nada se fala a respeito de fechar-o-Orkut-inteiro-porque-uma-comunidade-fala-mal-do-Barichello (ufa!).

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Plutoed

A palavra “plutoed” foi escolhida a palavra do ano de 2006 pela American Dialect Society. O verbo “to pluto” teria o mesmo sentido de “rebaixar ou depreciar algo ou alguém”, assim como aconteceu no ano de 2006 com o planeta Plutão (rebaixado à condição de planeta-anão). Dentre as concorrentes, incluíam-se as palavras “murse” (uma bolsa para homens – “a man’s purse”), e YouTube (verbo para ‘usar o YouTube’). Plutoed, adaptado ao português, seria algo como “plutonizar” ou “plutar” algo ou alguém. Será que a palavra pega?

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Livros e filmes em versão hiper-resumida

Inspirados na onda de fazer versões condensadas de grandes obras para quem não tem tempo para ler o livro completo, dois amigos norte-americanos criaram o site “Book-a-Minute”, brincando com a idéia de que a versão resumida pode servir para informar tudo sobre uma determinada obra. O site traz diversas resenhas ultracondensadas de obras clássicas, infantis e de ficção científica. Há livros que são resumidos em apenas uma frase, e outros que incluem até mesmo uma versão superabreviada dos diálogos presentes na obra. Além do Book-a-Minute, há também o “Movie-a-Minute”, para quem não tem tempo de ver todos os filmes que gostaria de ver por causa da correria do dia-a-dia.

Alguns exemplos: (é mais divertido para quem já leu o livro ou já viu o filme)

Se um viajante numa noite de inverno (Italo Calvino)

O Sexto Sentido (filme)

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Do inimaginável ao real

Do epílogo do livro “A inteligência coletiva”, de Pierre Lévy:

O possível é aquilo que não parece impossível, mas que não leva em conta as condições presentes, e sim as condições que não contrariem a lógica ou as leis físicas. Já o factível é aquilo que é possível levando-se em conta as condições presentes de transformação. Nesse contexto, o desenvolvimento da técnica tem por função diminuir a distância entre o possível e o factível (o que era possível há alguns anos atrás pode se tornar factível quando um determinado instrumento técnico passa a permitir que algo que era antes apenas considerado apenas como possível seja de fato realizável). A esfera do factível envolve tudo aquilo que pode ser transformado em algo concreto e real, a partir dos recursos tecnológicos que se dispõem em determinada época, em determinado lugar.
A ciência amplia a esfera do possível. O desenvolvimento científico torna o impossível possível (e os instrumentos técnicos levarão o possível ao factível, e a ação humana transformará o factível em real). O impossível também pode ser tornado possível em uma obra literária de ficção científica. Nesse caso, trata-se de um real ficcional: o impossível torna-se possível, factível ou até mesmo real dentro da perspectiva daquela obra. Fora da obra, será novamente considerado impossível.
A cultura, por sua vez, permite que se faça deslocamentos da esfera do inimaginável ao imaginável. E o pensamento permite que se vá do inimaginável ao imaginado (algo só será imaginado após ter sido cogitado pela primeira vez em nosso pensamento…). O inimaginável não existe, talvez apenas em potência: é preciso imaginar alguma coisa, é preciso pensar que algo é possível, para que esse algo saia da esfera do inimaginável e parta para a esfera do imaginado (para então poder adentrar na esfera do possível, do factível, e assim por diante).

Desse modo, o caminho para que algo seja realizado é:
– Pensamento, que leva do inimaginável ao imaginado;
– Cultura, que leva do inimaginável ao imaginável;
– Ciência, que leva do imaginável (mas impossível) ao possível;
– Técnica, que leva do possível ao factível;
– Ação humana, que leva do factível ao real.

Lévy (1999) desenvolve esse caminho não em uma cadeia linear, mas em um movimento espiral, que vai do inimaginável ao real. No contexto da obra, esse caminho é apresentado para mostrar que a inteligência coletiva não é, de fato, uma utopia. Ela se torna possível a partir do momento em que o desenvolvimento científico permite que se desenvolvam ferramentas capazes de levar o que antes era um sonho ao campo do factível.
Para que algo se torne possível, o primeiro passo é pensar. Qualquer coisa pode se tornar possível a partir do pensamento.
As ferramentas técnicas estão aí. O ciberespaço está em pleno desenvolvimento, as novas tecnologias permitem interação entre os indivíduos em tempo real. O que falta para que essa parafernália toda passe a ser usada para a construção coletiva do saber? A chave para isso tudo talvez esteja na ação.

“O papel da informática e das técnicas de comunicação com base digital não seria ‘substituir o homem’, nem aproximar-se de uma hipotética ‘inteligência artificial’, mas promover a construção de coletivos inteligentes, nos quais as potencialidades sociais e cognitivas de cada um poderão desenvolver-se e ampliar-se de maneira recíproca” (1999, p. 25)

Referência:
LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva – por uma antropologia do ciberespaço. 2. ed. São Paulo: Edições Loyola, 1999.

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